A nossa experiência criando uma criança poliglota – parte 1

Faz muito tempo que estou enrolando para contar como está sendo criar uma criança numa ilha poliglota. Antes e depois de ser mãe, eu li muito sobre bilinguismo, trilinguismo, mas nunca li nenhuma experiência de alguém que tenha criado uma criança com cinco línguas diferentes (multilinguismo). E vejam bem, no nosso caso, não foi por opção, porque queríamos que nossa filha estivesse preparada para o mercado de trabalho, que ampliasse seus horizontes nem nada disso, simplesmente esse é o contexto em que nós vivemos.

Tudo começou quando eu me casei com um arubiano, oito anos atrás. Eu expliquei como o poliglotismo funciona na sociedade arubiana bem detalhadamente nesse post aqui. Desde o início do casamento e da decisão de ser mãe, eu soube que ia falar em português com a minha filha. É até estranho ter que explicar os motivos disto, mas depois de tantos anos fora do Brasil em países diferentes e de ver como a grande maioria dos brasileiros que mora fora não fala português com seus filhos, ou como alguns até começam a falar e depois que a criança responde as primeiras palavrinhas em outro idioma, já desistem e explicam para os amigos e familiares que a criança não quis aprender português, eu prefiro explicar minhas razões. Eu quis falar português porque quero que minha filha me entenda perfeitamente, não só entenda minhas palavras, mas entenda meus sentimentos, meu contexto. Quero que ela possa conhecer e conviver com a minha parte da família sem precisar de traduções. Quero que ela um dia possa ler os mails que eu mando para o email que nós criamos para ela quando ela tinha só alguns meses e onde eu conto como ela vai crescendo, para que nós duas possamos recordar os momentos importantes da sua vida. Quero que um dia ela possa ouvir e entender uma letra do Chico Buarque. Que um dia possa assistir e dar risadas com o Auto da Compadecida. Para mim, nunca foi importante saber se crianças que são criadas com mais de um idioma demoram ou não em falar, se têm melhor aprendizado, se são alfabetizadas mais facilmente, ou se diminuem suas chances de ter Alzheimer no futuro. Por que para mim, o valor de poder comunicar com minha filha na minha própria língua está acima de qualquer estudo ou pesquisa.

Por que deu certo

Acho que um dos principais motivos foi porque o meu marido apoiou, assim como a família dele. Nesses anos morando fora, todos os casos que eu conheci de mães ou pais brasileiros que nunca nem tentaram falar português com os filhos foi porque o parceiro e/ou a família não aceitou. É aquela coisa de: meu marido diz que vai confundir a cabeça dele/dela, minha sogra diz que o menino(a) vai responder alguma coisa que ela não entende, quando ele/ela crescer, eu ensino.

No nosso caso, meu marido já cresceu poliglota, como todos os arubianos. Além disso, ele conhece alguns arubianos filhos de estrangeiros que já tinham uma quinta língua. Para completar, a esposa do irmão dele fala com nossos sobrinhos em espanhol. Ela nasceu em Aruba, mas é filha de panamenhos, foi criada em espanhol e decidiu continuar falando a língua dela com os filhos. Assim que para ele e para a família dele falar a própria língua com o filho é algo normal e esperado. Curiosamente, da minha parte da família teve gente que achava que ele não devia falar papiamento, a língua dele, com a filhota. Por que é uma língua que só se fala em algumas ilhas do Caribe, por que todo mundo em Aruba fala inglês ou espanhol, então para que…Enfim, nenhum motivo que justifique que uma pessoa não possa falar a própria língua com seu filho.

Eu me lembro que quando a filhota tinha pouco mais de um aninho, eu li esse excelente post da Luciana Misura sobre bilinguismo e o que mais ficou martelando na minha cabeça foi a importância do número de horas que a criança é exposta ao idioma. Na época eu até comentei angustiada, pensando como eu ia ter uma criança que falasse português, sendo exposta a tantos idiomas, hehehe. No final foi mais fácil do que eu pensava.

Uma das coisas que eu tenho certeza que, no nosso caso, ajudou muito foi o fato de eu ter parado de trabalhar e ficado com a Diana. Por que o número de horas que a criança é exposta a um idioma conta muito, então se o pai ou a mãe, que são a única “fonte” do idioma para a criança, trabalha o dia inteiro, esse idioma já entra em desvantagem. Se uma criança filha de brasileiro(a) vai à creche ou escola durante o dia e só vai ouvir o português à noite e nos fins de semana, ela não vai estar sendo exposta ao idioma o tempo suficiente para ser fluente. Mais difícil ainda se um dos pais for do país, então a criança vai ter todo o meio (escola, amigos, família, vizinhos) falando uma língua e apenas algumas horas ou minutos ao dia escutando o português. Se esse é o caso, eu acho que vale muito a pena contar com a televisão (com vídeos), com livros e com a internet, que tem também muita fonte de vídeos legais para crianças.

A consciência de que a criança vai aprender a(s) língua(s) do lugar sim ou sim, sem que isso seja motivo de preocupação também ajuda. Desde que a Diana nasceu, eu assumi que a minha responsabilidade seria ensinar português, qualquer outra língua que procurasse o seu espaço, porque eu sabia que cedo ou tarde ela ia aprender. E inclusive tive que ouvir críticas ou comentários (que entravam por um ouvido e saíam pelo outro) porque ela até os 2 anos e meio não falava espanhol, que era o idioma do país em que morávamos.

A decisão de falar português com ela nos influenciou antes mesmo que ela nascesse. Antes mesmo de ficar grávida, nós decidimos mudar de cidade, porque morávamos em Barcelona, onde se fala o catalão e a idéia de expor um filho a uma sexta língua era aterrorizante até mesmo para nós, que já somos considerados loucos de pedra por muita gente, kkkk. Chegamos a buscar alguma escola holandesa por lá, não tinha. Queríamos até mesmo que fosse possível que a nossa futura filha estudasse numa escola em que se ensinasse o espanhol: também não rolou por causa do sistema de imersão imposto pelo governo catalão. Lá todas as escolas públicas ou privadas ensinam catalão e o espanhol é dado como língua estrangeira, poucas horas por semana. Nas escolas internacionais (existem escolas americanas, francesas, alemãs, etc), o catalão é obrigatoriamente a outra língua ensinada e não o espanhol. Então só nos restou procurar trabalho fora da Catalunha. Por sorte, no mesmo mês que eu fiquei grávida meu marido conseguiu um trabalho em Madrid, onde nasceu a filhota.

Outro fator que eu acho que ajuda é não deixar passar quando a criança fala errado. Uma criança exposta a mais de uma língua, invariavelmente vai trocar alguma palavrinha e misturar idiomas. O problema é que alguns pais identificam esses errinhos como uma vontade, como se a criança não quisesse ou se recusasse a falar em português. Só que eu sempre encarei como uma simples falta de vocabulário, então se ela fala uma palavra em algum outro idioma, eu corrijo e repito a frase como deveria ser.

E finalmente, nunca li isso em nenhum livro, mas eu resolvi nunca falar palavras de bebezinho com ela, tipo: papá, mimir, tetê, etc. Por que eu acho que ela já precisa aprender tantas palavras em tantos idiomas, que não vejo o sentido de usar palavras que só servem para uma certa época da vida.

Mas o nosso caminho para o multilinguismo foi complexo, com mudança de país, ajustes e bastante jogo de cintura, por isso vou explicar como exatamente foi o processo de aquisição da linguagem no próximo post.

Seguro de viagem internacional ou saúde em Aruba

Estamos a menos de uma semana de ir para o Brasil e entre os itens obrigatórios para os nossos preparativos de viagem está contratar um seguro de viagem internacional. Então, deixa eu aproveitar para esclarecer as dúvidas de quem está vindo e quer saber como funciona a saúde aqui também.

Sobre como funciona o sistema de saúde para locais, eu expliquei nesse post aqui. Só que se você vem como turista, nada disso vale para você. Até onde eu sei, independente do tipo de sistema de saúde que cada país tenha – pública ou privada – as regras só valem para cidadãos e não incluem turistas. Então para você, tudo sempre vai ser pago. Inclusive os remédios que, como eu expliquei, são gratuitos para os locais, desde que sejam prescritos por  um médico. Existem bem poucos remédios que podem ser comprados sem receita, basicamente xaropes para tosse e vitaminas. O resto todo somente com receita. Por isso vale a pena se precaver e trazer os remédios que você possa precisar. E eu acho que vale a pena ir para todas as partes com um cartão de crédito, porque mesmo em caso de urgência, eles vão pedir, sério. Nós conhecemos uma americana que se hospeda aqui há muitos anos. Ela tem um quarto por onze semanas consecutivas no mesmo hotel timeshare que meus sogros tem, então digamos que ela praticamente mora aqui quase três meses do ano. Uns anos atrás, ela sofreu um acidente de carro num cruzamento, por sorte perto do hospital. Ela quebrou o braço, sofreu umas contusões e foi levada ao hospital com rapidez. Meio grogue e assustada, ela estava ainda na maca dentro da ambulância quando o paramédico perguntou se ela tinha cartão de crédito com ela. Como ela ainda estava meio zonza, não respondeu na hora. O paramédico resolver repetir a pergunta em vez de perguntar como ela se sentia, hehehe. Segundo ela nos contou, o pessoal só ficou tranquilo para atendê-la depois de ter certeza de que ela sim, tinha um cartão de crédito. :)

Como funciona

De nada adianta fazer um seguro de viagem e não saber usar. Isso eu descobri por conta própria uns anos atrás. A primeira vez que eu viajei para fora do Brasil foi nos idos de 97, quando eu fiz um mochilão pela península ibérica. Precavida, fiz um seguro de viagem assim que eu comprei a passagem. Um belo dia, caminhando em Córdoba à noite, eu pisei em falso e torci o pé. Pensando que não tinha sido grande coisa, eu fui dormir tranquila. No dia seguinte, parecia que tinha nascido uma batata no meu tornozelo. 😮 Resolvi ir para o hospital, onde enfaixaram meu pé, me deram uma receita de anti-inflamatório e me mandaram comprar uma tobillera (tornozeleira), aumentando o meu vocabulário de espanhol da época. :p Eu guardei o recibo de tudo e voltei para o Brasil tranquila, segura de que tudo ia ser ressarcido. Afinal, era para isso que eu tinha feito o seguro, certo? Errado.

Não é assim que funcionam alguns seguros de viagem. Normalmente, eles te dão um número de atendimento 24h e qualquer coisa que aconteça, a não ser que seja urgência mesmo, tipo um acidente, é preciso uma autorização do seguro. Nos destinos mais comuns – e esse é o caso de Aruba – o seguro tem acordo com alguns médicos e ao ligar para o número de atendimento, eles mandam um médico para o seu hotel ou te dão o número de um médico para que você mesmo ligue. Esse médico vai te receitar o que você precisa e, se necessário, autorizar a sua ida para um hospital ou clínica conveniada com o seguro. Eu sei que existem várias clínicas que atendem com convênio de seguradoras aqui em Aruba, mas é inútil eu dar o endereço ou telefone porque a seguradora é que pode informar qual você pode ir.

Outro exemplo de como funciona um seguro. Na época que as nuvens do vulcão islandês paralisaram quase toda Europa, eu tinha duas conhecidas de férias no México, cada uma com seu marido. Os dois casais tinham seguro de viagem. Ao término da estadia não havia vôos para voltar para a Espanha e eles foram forçadas a ficar alguns dias mais. O que um casal fez? Resolveu pagar o resort que eles estavam alguns dias mais e quando voltaram para casa foram tentar reaver o dinheiro. O seguro deu uma banana para eles. O que o outro casal fez? Ao serem avisados de que não podiam voltar para casa, ligaram para o seguro. A seguradora disse que havia feito um acordo com um hotel do centro, um três estrelas bem longe da praia e do resort onde eles estavam hospedados. Eles foram para esse hotel, sem precisar pagar nada e ficaram lá esperando que os aeroportos europeus fossem reabertos. Então, fique ligado nas regras da seguradora para não fazer seguro à toa.

O nosso caso

Não sei como é no Brasil, mas aqui existe a opção de se fazer um seguro de viagem anual. A vantagem, em 1º lugar é econômica. Como vamos por algo mais que 30 dias, se fizermos um seguro por dia, o preço sai o dobro do que vamos pagar por um seguro anual. E com esse seguro estamos tranquilos para o resto do ano, os três. Assim que não tenho que preocupar com alguma viagem de trabalho que meu marido possa fazer ou se resolvermos aproveitar a semana do saco cheio em outubro.

Nas últimas vezes que fomos ao Brasil, fomos sem seguro. Mas no ano passado meu sogro teve um piripaque enquanto estava fazendo um cruzeiro e teve que ser hospitalizado de urgência. E também uma das minhas sobrinhas teve um ataque de bronquite enquanto estava de férias na Disney. Nem meus sogros nem meu cunhado tiveram que gastar nada porque o seguro cobriu. Como não estamos a fim de dar mole (vai que somos os próximos da lista), este ano viajamos com seguro sim.  E você, já precisou usar seu seguro de viagem? Conta aí como foi!

O bondinho e a renovação de Oranjestad

O mesmo trilho vai ser usado na ida e na volta, para que haja espaço para as pessoas caminharem

 

O centro de Oranjestad está passando atualmente por uma grande renovação, com a instalação dos trilhos para o bonde ou streetcar, que deverá começar a funcionar em dezembro deste ano ou janeiro do próximo. Vai ser um bondinho aberto, no estilo do de Santa Teresa, mas um deles vai ter dois andares. Ele vai sair do porto, onde descem os turistas dos cruzeiros, vai ir até o final da rua principal – a Mainstreet para os turistas ou Caya Grandi para os locais – e voltar ao porto, contando com algumas paradas ao longo do caminho. Vai ser totalmente gratuito e faz parte de um grande processo de revitalização do centro.

Quando meu marido foi convidado para trabalhar aqui, dois anos atrás, o ministro-presidente contou para ele que tinha esse projeto-sonho-visão de levar um bonde para a rua principal. A nossa reação e de praticamente todo mundo foi de ceticismo: para que um bonde? quantas outras coisas dá para fazer com esse dinheiro? por que não um mini-ônibus? Estes e tantos outros questionamentos foram ouvidos nas ruas e no parlamento.

Aos poucos nós começamos a entender o contexto e as razões que levaram a esse projeto de trazer um bonde para Aruba e resolvi contar para vocês. Aruba recebe quase um milhão e meio de turistas ao ano e desse total, 41% são turistas de cruzeiros, que passam apenas algumas horas na ilha. O comércio do centro sempre viveu essencialmente dos locais e desses turistas, que eram a alma dessa região até os anos noventa. Em 1996 foi inaugurado o Royal Plaza, bem em frente ao porto. Se alguém já veio a Aruba deve se lembrar desse shopping, pela singela razão dele ser cor-de-rosa. :) Um efeito que ninguém esperava da inauguração do Royal Plaza é que, de certa maneira, ele “tapasse” a entrada para a rua principal. Antes, os turistas chegavam lá naturalmente, ao descer do navio. Com a inauguração dele, chegar à rua principal deixou de ser natural e passou a ser praticamente um acaso para o turista de cruzeiro. Além disso, a maioria acaba não caminhando toda a rua e o passeio acaba já nos primeiros metros. A importância desse público não é somente pelo fator de compra, mas porque muitos deles usam sua viagem de cruzeiro para escolher um próximo destino de férias, então impressão é tudo.

Eu continuo adorando fazer mapas em Google Maps. Em azul está a rua Betico Croes, conhecida com Mainstreet e de vermelho está a rota do trem, ligando o porto à rua principal. O percurso total vai ser a parte de vermelho e a parte de azul.


View Caya Betico Croes in a larger map

Atualmente, o turista de cruzeiro típico caminha ao longo da Marina, onde não tem muito comércio, com exceção de algumas lojas de super luxo, chega até o Seaport Mall, um shopping à beira-mar em frente ao Renaissance, toma alguma coisa por lá e volta para o navio. O tempo de permanência médio na ilha é de pouco mais de 1 hora. Tudo isso está a ponto de mudar com a disponibilização de um meio de transporte gratuito que vai levá-los onde eles tem que ir. A parcela de turistas que toma algum dos muitos tours oferecidos na chegada também vai ser afetada, porque o governo fez um acordo com as operadoras de turismo para que ao fim do tour, eles não sejam levados mais ao navio de volta, mas sim deixados no final da rua principal, onde irão tomar o bonde, de graça, e aproveitar para ver essa parte da ilha.

O outro motivo do bondinho é o chamado “produto Aruba”. Aruba é uma entre centenas de outras ilhas caribenhas e cada uma delas precisa ter um diferencial para atrair turistas. Existem muitas medidas que estão sendo tomadas para reforçar esse diferencial e o bondinho certamente é uma delas. Algumas semanas atrás, meu marido explicou o projeto de revitalização do centro para um grupo de profissionais do ramo de cruzeiros. Eles ficaram animadíssimos, dizendo que finalmente uma ilha resolveu inovar e melhorar seu leque de atrativos. Segundo eles, atualmente Aruba é a única ilha que está trabalhando no sentido de diferenciar-se dos outros destinos. Para eles também, ter um diferencial tão único, como um bondinho, ajuda muitíssimo na hora de vender um pacote. Senão fica aquela coisa: no 1º dia vamos a uma ilha caribenha com areia branquinha, no 2º dia vamos a outra ilha caribenha com areia branquinha, hehehe. A chegada do bonde já está atraindo novas lojas e muitas das atuais estão em reforma. Também faz parte do projeto a criação de pequenos espaços públicos ao longo da rua, como mini-pracinhas com quiosques para venda de produtos alimentícios e lugares para sentar-se.

Quem vier para Aruba a partir do próximo verão vai poder aproveitar em primeira mão essa experiência de passeio de bondinho centro. 😀